O tema da redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2024 foi “Desafios para a valorização da herança africana no Brasil”. Professores ouvidos pelo Correio ressaltaram a relevância do tópico escolhido e também o quão inesperada foi a escolha para a prova. Também avaliaram ser um assunto fácil para se dissertar a respeito.
O professor de sociologia Bruno Borges, professor na Escola de Formação Continuada dos Profissionais da Educação (Eape), do GDF, afirma que o tema não era “a grande aposta” de quem acompanha a avaliação, apesar de ser uma temática muito oportuna. “O processo de construção da identidade nacional se deu pautado por desigualdades, por violência, por uma história de escravidão, pela invisibilidade de algumas culturas, e trazer isso à tona na redação do Enem é mobilizar esse debate para mais de 4 milhões de estudantes”, frisa o professor.
Ana Alice Gargioni, doutora em linguística aplicada e professora no Instituto Federal Goiano, também ressaltou o quão surpreendente foi o tema deste ano. “Acho que foi uma grande surpresa, pois como o Enem já tratou da questão racial antes, não acreditava que ia cair novamente algo voltado a esse eixo, porque quando pensamos em desafios para valorização da herança africana no Brasil, não falamos só da da influência, das pessoas que foram escravizadas, mas, sobretudo, dos aspectos culturais, costumes e práticas, tanto religiosas quanto de alimentação”, observa.
As apostas de Gargioni, eram em assuntos voltados para tecnologia ou meio ambiente. Mas ela considera o tema escolhido interessante, já que, pela primeira vez, o dia da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro, será feriado nacional.
Relevância
A professora mestre de literatura, português e espanhol Camila Santin afirma que “a prova do Enem é uma possibilidade imensa de abrir a discussão, porque até mesmo quem é contra, nessa hora, precisa pensar: mas e se eu fosse a favor como eu defenderia?”. “Então, é muito interessante toda vez o Enem fomentar a discussão na sociedade”, avalia.
Ela também frisa que é um tema fácil de escrever sobre. “Acredita-se que foi um tema relativamente fácil. É claro que você sempre vai ter aí um grupo que vai reclamar, vai dizer que é lacração. São as mesmas pessoas que têm essa resistência a perceber os problemas sociais existentes no Brasil”, disse a professora.
“Quando a gente pensa em cultura, até na linha de estereótipos, pensamos em samba em carnaval. Isso tudo é herança, mas há um apagamento dessas pessoas e sabemos que isso tudo vem por conta dos diversos preconceitos e da ausência do Estado na trajetória dessas pessoas que foram violentadas, depois apagadas, individualizadas e esquecidas. Acho que precisamos falar sobre isso, para que possamos continuar cobrando por melhorias, sobretudo, para para essas pessoas”, avalia Ana Alice.
O professor e autor do Colégio e Sistema pH Thiago Braga avalia a escolha do tema como “absolutamente relevante para ser discutido pelos jovens brasileiros em 2024”. “A herança africana no Brasil é essencial para a formação da cultura brasileira em diversos aspectos, incluindo o linguístico, o religioso e o cultural de maneira geral. Muitas vezes, essa raiz africana é dissociada ou desvalorizada quando identificamos esses elementos culturais em nossa sociedade”, detalha o professor.
Ele ressalta que a apropriação cultural, o respeito à diversidade e o resgate e construção de memória são elementos importantes a serem abordados pelos alunos neste tema. “Sem dúvida, muitos argumentos vão tocar em questões como desigualdade cultural e racismo, mas é importante destacar que esses não são o foco do tema. Não se trata de racismo ou desigualdade, mas sim de memória e da valorização de aspectos culturais africanos que são fundamentais para a formação da cultura brasileira”, explica.
Na avaliação do professor, esse é um tema para o qual muitos alunos estarão preparados, já que temas culturais são bastante explorados na preparação para o Enem. “De fato, é uma discussão extremamente importante, necessária para os jovens brasileiros, e mais um excelente tema proposto pela Banca do Enem”, avalia.
Fonte: Site do Jornal Correio Braziliense.